O começo
Toda quinta-feira, uma crônica.
É com essa missão que nasce a Revista Solário.
Confesso que não foi fácil dosar a ambição. Uma por semana é pouco? É muito?
— Pode acabar sendo muito pra quem escreve e pouco pra quem lê — avaliou uma amiga. — Ou pior: o contrário.
Ela está certa. Uma boa revista chega sempre adiantada quanto ao assunto e atrasada quanto à sede do leitor. Buscando esse equilíbrio, inicialmente eu havia proposto um compasso quinzenal. Assim — pensei — o leitor não se cansaria de mim e eu teria tempo de sobra pra escolher temas, refletir e colocar tudo no papel. Que ilusão. Ainda na primeira peça, compreendi que quinze dias são uma eternidade. Cronista sossegado vira historiador.
Duas semanas atrás, por exemplo, Virgínia e Vini Jr. ainda eram solteiros — ele um pouco mais do que ela.
Duas semanas atrás, quem sabia o nome do governador do Rio?
Duas semanas atrás, eu ainda não conhecia Budapeste e nunca tinha lido nada da Shirley Jackson.
Não, quinzena é coisa de salário. De crônica, a gente precisa com mais frequência. Certo mesmo seria todo dia, mas aí já complica do outro lado.
Hoje, por exemplo, eu acordei meio tarde e tive um compromisso de manhã. Depois, tomei um cafezinho e aproveitei o sol pra passear um pouco pela cidade. Quando finalmente sentei pra escrever, já eram quase três da tarde. Duvido que eu termine este texto aqui até o fim do dia (atualização: não terminei mesmo).
Vamos deixar a papagaiada da disciplina para os influenciadores de produtividade. Escrever é uma atividade de calendário, não de relógio. Em vez disso, busquemos inspiração nas coisas que a gente faz não por compromisso, mas por natureza. Tipo dormir. Sabe aquele sentimento gostoso — e, pra muitos de nós, cada vez mais raro — de deitar na cama com sono e acordar descansado? Quero uma rotina de escrita que siga a mesma toada: abrir o caderno cheio de entusiasmo e fechá-lo exausto, com um suspiro de missão cumprida. Nessa utopia, um texto por semana me parece adequado. Nem de menos, nem demais.
— Toda quinta-feira, uma crônica? — repetiu minha amiga, ponderando se tinha tempo (e saco) para um compromisso desse.
— A leitura é anônima — lhe assegurei. — Pode ler uma a cada duas, três. Não vou nem ficar sabendo.
Mentira. Vou cobrar meus amigos de lerem as malditas crônicas assim que saírem do forno; fazer chamada oral pra pegar no pulo os mentirosos. A publicação pode ser semanal, mas o meu rancor é eterno. Digo isso porque vejo na amizade um compromisso com as fixações do outro. Se você só presta atenção no seu amigo quando o que ele fala te interessa logo de cara, qual é a diferença entre o amigo e um canal de TV? A amizade sincera compartilha com a arte o testemunho de que tudo na vida é, ao mesmo tempo, muito maior e muito menor do que parece. Ao bom amigo, cabe abrir-se para que o grande do outro possa ser grande para ele também — mesmo que por apenas cinco minutinhos por semana.
Mas, cobranças à parte, me sinto privilegiado nesse comecinho, pois posso afirmar que todo leitor é amigo. Por meio de perseguição e intimidação, pretendo logo garantir também que todo amigo seja leitor. E com esse objetivo em mente, me fiz a segunda e última pergunta: qual é o melhor momento da semana pra publicar uma crônica, de forma a anular as desculpas de quem não leu? Vamos analisar:
A segunda-feira é um saco. A terça, convenhamos, não tem um pingo de charme. A quarta é muito no meio; a sexta e o sábado — esquece — são dias de passeio. E o domingo? Porra, o domingo também é um saco. Resta, portanto, apenas a quinta-feira; essa ponte entre o cansaço e a euforia, que pede uma cerveja no fim do dia, um cineminha, uma resenha. Mas, se de quinta não encaixar legal, não se preocupe — eu mudo para outro dia e refaço o discurso. Combinado?
Assim sendo, amigo leitor, está publicada a promessa, a sentença e a certidão de nascimento da Revista Solário:
Toda quinta-feira, uma crônica.
Essa daqui já conta?
Eu podia estar matando, roubando ou fazendo publi de bet, mas aqui estou, na humildade, pedindo pra você compartilhar essa publicação com alguém especial. Um amigo, um parente, um ex que você não esquece, um crush que já esqueceu de você. E se você quiser receber as publicações da Solário por email, basta se cadastrar clicando no botão Subscribe. A Solário é gratuita e escrita por humanos, para humanos. Sem agenda oculta e sem IA.